Deixa-te guiar, alma humana, um passo para dentro do reino da matéria fina! O país das sombras vamos percorrer sem demora; pois dele já falei. É aquele país, onde têm que permanecer aqueles, que ainda são demasiadamente broncos para se utilizar corretamente de seu corpo de matéria fina. Exatamente todos aqueles, que aqui na Terra consideravam-se excepcionalmente sagazes. No reino da matéria fina são mudos, cegos e surdos, porque o intelecto terreno, como produto de seu corpo de matéria grosseira, não pôde vir junto até aqui, mas sim permaneceu nos limites restritos, que ele, por estar preso à Terra, jamais pode transpor.
A primeira conseqüência de seu grande engano tornar-se-á evidente a uma alma humana logo depois da morte terrena, por se encontrar inepto no reino da matéria fina, desamparada e fraca, muito pior do que uma criança recém-nascida na Terra de matéria grosseira. Por isso, são chamadas de sombras. Almas, que ainda intuem sua existência, mas não conseguem ficar conscientes disso.
Deixemos agora para trás esses tolos, que nesta Terra, querendo saber tudo melhor, tagarelavam o bastante sobre coisas insignificantes e agora têm que ficar calados. Entramos na planície da penumbra! Um sussurro chega ao nosso ouvido, bem consentâneo com a pálida luz da penumbra, que nos rodeia e deixa reconhecer, de modo impreciso, contornos de colinas, prados e arbustos. Tudo aqui está coerentemente sintonizado à penumbra, o que pode acarretar um despertar. Mas somente pode, não acaso deve!
Aqui não é possível nenhum som livre e alegre, nenhuma visão clara. Apenas um semidespertar ou um permanecer reprimido, consentâneo com o estado das almas, que aqui se encontram. Todas elas têm um movimento lânguido, deslizando cansadas, apáticas, exceto um indefinido impelir para aquela uma direção, onde, ao longe, parece emergir um tênue róseo, que, anunciando luz, atua como doce encantamento sobre as almas aparentemente tão cansadas. Almas apenas aparentemente cansadas; pois são preguiçosas no espírito, por isso, seus corpos de matéria fina são fracos. —
O vislumbre róseo na distância longínqua acena de modo prometedor! Despertando esperanças, incentiva à movimentação mais ativa. Com o desejo de atingir esse vislumbre, os corpos de matéria fina aprumam-se mais e mais, em seus olhos surge a expressão de uma conscientização mais forte e, cada vez mais firmes, seguem naquela uma direção. —
Nós caminhamos junto. O número de almas ao nosso redor aumenta, tudo se torna mais móvel e mais nítido, o falar torna-se um pouco mais alto, transforma-se em um forte murmúrio, de cujas palavras depreendemos que os que avançam proferem orações, incessantemente, de modo apressado, como que em estado febril. As massas tornam-se cada vez mais densas, o avançar transforma-se em um empurrar, grupos estancam diante de nós, são compelidos para trás pelos precedentes, para novamente pressionar para frente. Assim, passa um ondular sobre as massas aglomeradas, das orações elevam-se gritos de desespero, palavras de medo suplicante, de tímida exigência, e, aqui e acolá, também sufocado lamento da maior desesperança! —
Passamos rapidamente por cima da luta de milhões de almas e vemos que diante delas se encontra, de modo rígido e frio, um obstáculo ao prosseguimento, contra o qual investem em vão, que banham inutilmente com as lágrimas.
Barras grandes e fortes, mui próximas umas das outras, impõem de modo inexorável parada ao seu avanço! —
E mais forte incandesce ao longe o róseo vislumbre, mais ansiosos arregalam-se os olhos daqueles, que o escolheram como alvo. Suplicantes são estendidas as mãos, que convulsivamente ainda se agarram aos rosários, deixando correr as contas por entre os dedos, uma após outra, balbuciando! As barras, porém, permanecem inabaláveis, rígidas, separando do belo alvo!
Passamos ao longo das densas filas. É como se não tivessem fim. Não centenas de milhares, não, milhões! São todos aqueles, que na Terra julgavam-se “fiéis” sérios. Quão diferente haviam imaginado tudo! Acreditavam que seriam alegremente aguardados, seriam dadas respeitosamente as boas-vindas.
Bradai-lhes: “O que vos adianta, ó fiéis, a vossa prece, se não deixastes a Palavra do Senhor tornar-se ação, evidência em vós próprios!
O vislumbre róseo ao longe é a saudade pelo Reino de Deus, que arde dentro de vós! Tendes dentro de vós a saudade dele, mas obstruístes o caminho para lá com formas rígidas de concepções erradas, as quais vedes agora diante de vós como barras que impedem, igual a uma grade! Deixai cair aquilo que assimilastes de concepções erradas durante a existência terrena, aquilo que construístes para vós próprios nesse sentido! Lançai fora tudo e ousai levantar o pé livremente em prol da Verdade, como ela é em sua grande e simples naturalidade! Então estareis livres para o alvo de vossa saudade!
Mas vede, não o ousais, no constante medo de que poderia talvez estar errado aquilo, que assim fazeis, porque até agora pensastes diferentemente! Com isso, vós próprios vos tolheis e tendes que permanecer onde estais, até ser demasiado tarde para o prosseguimento e terdes que sucumbir junto na destruição! Não vos poderá ser auxiliado nisso, se vós próprios não começardes a deixar o errado para trás de vós!”
Bradai, pois! Bradai a essas almas o caminho para a salvação! Vereis que é totalmente em vão; pois somente mais forte recrudesce o ruído das infindáveis orações, e impede que esses rogadores escutem qualquer palavra que lhes poderia permitir caminhar para diante, ao encontro do vislumbre róseo e da luz. Assim, têm que ficar perdidas agora, não obstante alguma boa vontade, como vítimas de sua indolência, que não as deixou reconhecer mais, nem deixou assimilar mais do que as exterioridades de suas igrejas, templos e mesquitas. —
Entristecidos, vamos prosseguir. – Mas ali, diante de nós, está uma alma de mulher, em cujo rosto espraia-se subitamente uma serenidade cheia de paz, um novo brilho surge em seus olhos, que até agora olhavam cismando e em temerosa reflexão, tornando-se mais consciente, ela se apruma, torna-se mais clara... forte vontade da mais pura esperança faz com que erga o pé... e, respirando aliviada, encontra-se além das barras! Para essa alma de mulher as barras não constituíam mais qualquer impedimento, pois na profunda reflexão, intuindo com sensibilidade, chegou à convicção de que tudo aquilo que até então imaginava tinha que ser errado, e, sem receio, na alegre fé no amor de Deus, lançou de si esse errado.
Surpresa, vê agora quão fácil isso foi. Agradecendo, ergue seus braços, e uma inenarrável sensação de felicidade quer se manifestar em júbilo, no entanto, isso lhe sobreveio demasiadamente forte, demasiadamente poderoso, os lábios permanecem mudos, sua cabeça se inclina com leve estremecer, os olhos se fecham e pesadas lágrimas correm vagarosamente pelas suas faces, enquanto suas mãos se juntam para uma oração. Para uma oração diferente do que até então! Para um agradecimento! Para uma grande intercessão em favor de todos aqueles, que ainda se encontram atrás dessas rígidas barras! Por causa da própria concepção, que não querem abandonar como errada!
Um suspiro de profunda comiseração enche-lhe o peito, e, com isso, desprende-se dela como que uma última algema. Está agora livre, livre para o caminho rumo ao alvo por ela interiormente almejado!
Erguendo o olhar, vê diante de si um guia, e alegremente lhe segue os passos para o novo e desconhecido país, ao encontro do vislumbre róseo, que cada vez se torna mais intenso! —
Assim, outras almas se desprendem ainda daquelas massas que, atrás das barras das concepções errôneas, têm de esperar por sua própria decisão, por sua própria resolução, que pode conduzi-las adiante, ou retê-las até a hora da destruição de tudo aquilo, que não pode cobrar ânimo para abandonar o errado antigo. Somente poucas ainda se salvarão dos liames das concepções errôneas! Estão demasiadamente emaranhadas nelas. Tão rígidas como o seu agarrar a isso são também essas barras, que lhes impedem um prosseguimento para a ascensão. Estender-lhes as mãos para vencer esse impedimento é impossível, porque para isso incondicionalmente se faz necessária a decisão própria das almas. O próprio vivenciar dentro de si, que proporciona movimento a seus membros. Desse modo, pesada maldição recai sobre todos aqueles, que ensinam idéias errôneas às criaturas humanas a respeito da vontade de Deus na Criação, a qual outrora podia ser encontrada na Palavra do Salvador, mas que não permaneceu pura no texto da Bíblia, menos ainda nos esclarecimentos terrenos.
Deixai-as em sua obstinação continuar a recitar monotonamente orações, na ilusão de que a quantidade destas possa e deva lhes ajudar, porque a Igreja assim o ensinou, como se a vontade de Deus se deixasse mercadejar.
Prosseguimos pelo país da penumbra. Interminável parece o baluarte dessas barras, atrás do qual, a se perder de vista, empurram-se os retidos por ele . —
São, porém, outros. Grupos que, ao invés de rosários, seguram Bíblias nas mãos e nelas procuram desesperadamente. Aglomeram-se em redor de algumas almas que, doutrinando, querem dar informações, ao ler, sempre de novo, trechos da Bíblia. Exigindo, várias almas exibem aqui e acolá suas Bíblias, de joelhos, elas são erguidas muitas vezes como em oração... as barras, todavia, persistem, impedindo-as de prosseguir.
Muitas almas insistem em seu conhecimento da Bíblia, algumas, no seu direito de entrar no reino do céu! Mas as barras não oscilam!
Eis que uma alma de homem, sorrindo, abre passagem entre as filas. Vitorioso, acena com a mão.
“Tolos”, brada, “por que não quisestes ouvir? Já gastei a metade de minha existência terrena estudando o Além, portanto, para nós agora o Aquém. As barras, que vedes diante de vós, desaparecerão depressa por um ato de vontade, elas são criadas pela ilusão. Segui-me apenas, eu vos guio! Tudo isso já é familiar para mim!”
As almas em seu redor deram-lhe passagem. Ele avança para as barras, como se não existissem. Com um grito de dor, contudo, cambaleando recua subitamente. O choque foi duro demais e convenceu-o mui rapidamente da existência das barras. Com ambas as mãos ele aperta sua testa. As barras diante dele continuam inabaláveis. Com um acesso de cólera, ele as agarra e sacode-as impetuosamente. E grita com raiva:
“Então fui enganado pelo médium! E gastei ano após ano nisso!”
Não reflete que foi ele quem gerou os erros e propalou-os pela palavra e pela escrita, após ter interpretado as imagens, dadas pelo médium, segundo suas acepções, sem primeiro estudar as leis de Deus na Criação.
Não procureis ajudar esse homem ou outrem; pois todos se acham tão convencidos de si, que nem querem ouvir algo diferente do que o próprio intuir. Primeiro terão que se cansar disso, conhecer ou reconhecer a inutilidade, onde unicamente está ancorada a possibilidade de ainda escapar desse emaranhado de convicções errôneas, após longo vagar pelo país da penumbra.
Elas não são más pessoas, mas sim tais, que pura e simplesmente se aferraram apenas a concepções errôneas no seu procurar, ou que foram demasiado preguiçosas para meditar profundamente a respeito de tudo, ao invés de examinar com a mais cuidadosa intuição, se aquilo, que foi recebido, pode ser considerado como certo ou se contém lacunas, que em uma sadia reflexão intuitiva não são mais capazes de se manter como naturais. Deixai, portanto, cair as vazias exterioridades!
Tudo quanto é místico, o espírito humano afaste de si, uma vez que jamais lhe pode trazer um proveito. Somente o que ele mesmo intui de modo nítido, levando assim ao próprio vivenciar dentro de si, ser-lhe-á de proveito no amadurecimento de seu espírito.
A palavra “Desperta!”, que Cristo empregou com freqüência, quer dizer: “Vivencia!”. Não passes dormindo ou sonhando pela existência terrena. “Ora e trabalha” significa: “Faze do teu trabalho uma oração!” Espiritualiza aquilo que crias com tuas mãos! Cada trabalho, em sua execução, deve tornar-se uma adoração cheia de respeito a Deus, como agradecimento pelo que te é dado por Deus, de realizar algo de extraordinário entre todas as criaturas desta Criação posterior, bastando que apenas queiras!
Principia em tempo com o despertar, com o próprio vivenciar interior de tudo, o que equivale ao consciente intuir, também do que lês e ouves, para que não tenhas que permanecer no país da penumbra, do qual hoje esclareci apenas uma bem pequena parte.